domingo, 13 de maio de 2012

Uma nova redenção

Relembrando o texto publicado no Luis Nassif:
http://www.advivo.com.br/blog/luisnassif/homenagem-a-13-de-maio

Em 1988, ano em que se comemorava o centenário da abolição da escravidão no Brasil, a Vila Isabel vencia o carnaval na Marquês de Sapucaí com uma bonita homenagem ao herói abolicionista Zumbi dos Palmares. Nesse mesmo ano, a Mangueira levava para avenida em tom de louvor e denúncia aquela considerada por muitos a mais bela entre as mais belas de suas inúmeras composições:

 "Será que já raiou a liberdade ou se foi tudo ilusão? Será que a Lei áurea tão sonhada e há tanto tempo assinada, não foi o fim da escravidão? Hoje, dentro da realidade onde está a liberdade, onde está que ninguém viu? Moço não se esqueça que o negro também construiu as riquezas do nosso Brasil.."

 Era nossa festa popular de maior expressão trazendo a baila uma importante questão: A grave situação vivida pelo negro após a abolição da escravatura, o que alguns historiadores denominaram "liberdade vazia" – pois os meios necessários para sua inserção social não lhes fora apresentados com clareza, e estão sendo conquistados até os dias de hoje, na raça e na coragem.

 "...Pergunte ao criador quem pintou esta aquarela, livre do açoite da senzala, preso na miséria da favela" _ Assim prosseguia o samba da Estação Primeira, pisando forte na avenida pra tentar mostrar ao Brasil que aquele que também ajudou a construir essa nação não pode viver marginalizado, residindo em guetos e favelas, "sutilmente" segregado do resto da população.

 Hoje, passadas mais de duas décadas é possível perceber que, apesar da situação ainda ser preocupante, o quadro da desigualdade racial no Brasil apresenta sensíveis sinais de melhora. A semente plantada por Zumbi finalmente cresceu e já começa a sazonar seus frutos. O negro mais uma vez na história chamou pra si a 'responsa' e cada vez mais percebe-se como sujeito dessa transformação, numa luta de igual teor de bravura só que agora no plano ideológico - impulsionando ações afirmativas importantíssimas e, de forma ousada, fazendo acontecer.

 Assim como Anastácia não se deixou escravizar, milhares de cidadãos brasileiros de uns tempos pra cá, duvidaram dessa conversa mole de que "não somos racistas"e além de reconhecerem a luta que vem enfrentando nessa "gigantesca Casa Grande chamada Brasil" cada vez mais arregaçam suas mangas pra cobrar o que é seu por direito.

 Quando naquele ano comemorativo Jamelão cantava em verso e prosa o sonho da volta de Zumbi dos Palmares, do fim do sofrimento de uma raça, e chamava isso de "uma nova redenção" (..sonhei que Zumbi dos Palmares voltou, a tristeza do negro acabou foi uma nova redenção..) parecia mesmo estar pressagiando um novo período na história brasileira - já que o espírito de luta de Zumbi se faria presente em cada lar, em cada organização, em cada esquina, na favela ou no Congresso, na tv ou no cinema, no sinal ou na universidade, no dia-a-dia de bravura e conquistas de cada negro desse país.

 Valeu Zumbi, seu grito forte dos Palmares já ecoa pelos quatro cantos de um novo Brasil que nasce, chacoalhando as bases de uma sociedade onde um dia (de verdade) a cor da pele não determinará absolutamente mais nada, um dia onde estaremos de fato juntos e misturados, o dia onde estas minhas palavras perderão todo sentido. E neste dia poderemos encher o peito e dizer: Somos todos cidadãos brasileiros.

 E naquele 1988, naquele último dia de carnaval, o memorável samba da Estação Primeira, supra-sumo da mais bela poesia vinda da garganta de Jamelão, amanhecia a cidade de maneira alegre e festiva, como não poderia deixar de ser:

 "O negro samba, negro joga capoeira, ele é o rei na verde e rosa da Mangueira!"

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